Mocho-galego

O mocho-galego (Athene noctua) é uma ave de rapina nocturna de pequeno porte e compacta, com plumagem de cor variável, acastanhada com manchas brancas. Exibe partes superiores castanhas com pintas brancas – estas mais evidentes no dorso – e partes inferiores esbranquiçadas, fortemente listradas de castanho. A cabeça é grande e arredondada, sem ‘orelhas’. O disco facial, marcado de forma mais intensa nos indivíduos mais escuros, em conjunto com a cor amarela dos olhos e as listas supraciliares brancas e oblíquas, que sobressaem no mesmo, conferem a este mocho uma expressão severa. A cauda é curta, castanho-escura com barras esbranquiçadas e as patas são compridas relativamente ao corpo. O bico é amarelo-esverdeado e as garras são acastanhadas, apresentando estas a ponta mais escura. A fêmea é, em média, mais pesada que o macho.

Em Portugal Continental ocorre a subespécie A. n. vidalii.

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Distribui-se pela Eurásia e região Afrotropical, a sul do golfo Arábico e na costa africana do mar Vermelho e do golfo de Áden; na Europa encontra-se ausente na Escandinávia, Islândia e em algumas regiões do Reino Unido, Europa Central e Rússia. Esta espécie foi introduzida na Nova Zelândia e em Inglaterra. Em Portugal, encontra-se por todo o território continental, mais comummente na metade sul; é raro no litoral minhoto e particularmente abundante em algumas áreas do Algarve e do interior alentejano.

No âmbito do Projecto BARN, em 2008/2009, foi realizado um estudo com o objectivo de detectar locais de presença e de nidificação de aves de rapina nocturnas no concelho de Gouveia, tendo sido o mocho-galego uma das espécies alvo deste estudo. Esta espécie distribui-se pela área de estudo de uma forma mais ou menos regular e foi a espécie mais detectada (69 territórios), estimando-se a existência de 225 casais.

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Ocupa terrenos abertos, áreas rochosas e semidesérticas, estepes, pastagens, jardins e pomares, muitas vezes na proximidade de quintas e povoações. Surge desde o nível do mar até aos 4600 m de altitude.

Esta espécie é mais frequentemente encontrada em habitats antropogénicos e ocupa diferentes biótopos, denotando-se a sua plasticidade. Usualmente, o seu habitat inclui uma grande variedade de campos agrícolas com muros e montes de pedras, plantações de cereais, olivais, vinhas, hortas, sistemas agro-florestais. Evita zonas demasiado húmidas, florestas densas ou povoamentos florestais de produção e habitats de alta montanha. Independentemente do tipo de habitat, algumas das condições para este ser óptimo são ter alimento suficiente para o casal e descendência, disponibilidade de poisos e de locais para a nidificação.

A dieta do mocho-galego é maioritariamente constituída por insectos, em particular das ordens Coleoptera, Orthoptera e Dermaptera, outros artrópodes e pequenos mamíferos, podendo incluir também pequenas aves, répteis, anfíbios e minhocas (Lumbricidae). Normalmente esta ave captura as presas a partir de um poiso, abatendo-se sobre elas, mas também é capaz de as perseguir no solo.

Apesar de esta espécie poder ser observada com relativa facilidade durante o dia (no cimo de chaminés, casas abandonadas e nos postes e linhas, tanto dos telefones como eléctricas), o mocho-galego é essencialmente nocturno, caçando desde o ocaso até ao nascer do sol. Apresenta um voo rápido e ondulante, alternando batidas rápidas das asas com períodos em que ‘desliza’.

Quando disponíveis, o mocho-galego prefere nidificar em cavidades de árvores e em fendas de troncos ou ramos, sendo que, na falta destas, ocupa construções humanas – edifícios agrícolas, celeiros, muros de pedra, casas em ruínas, caixas-ninho – bem como montes de pedra e tocas de coelho.

O território é defendido durante todo ano, tornando-se esta defesa mais agressiva durante a época reprodutora que se estende de Março a Julho. A incubação de 2-5 ovos (cada ovo é posto com um intervalo de 24h) é realizada pela fêmea durante cerca de 27-28 dias; esta é alimentada pelo macho, durante este período. As crias podem ser avistadas fora do ninho mesmo antes de saberem voar, encontrando abrigo nos ramos ou vegetação junto ao ninho. Os juvenis começam a voar com aproximadamente 30-35 dias; os progenitores continuam a alimentá-los até cerca de 1 mês depois de estes começarem a voar. Atingem a maturidade sexual com 1 ano de idade.

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Na Europa, possui um estatuto de conservação desfavorável, devido ao declínio moderado que as populações desta espécie têm sofrido ao longo das últimas décadas; apesar disso, continua a ser considerada a espécie de Strigiformes mais abundante em Portugal.

Os principais factores de ameaça são de origem antropológica, como o abandono da agricultura tradicional, colisão com veículos – o mocho-galego é uma vítima frequente de atropelamentos – envenenamento por pesticidas, bem como a redução de presas devido ao uso de venenos, caça ilegal e pilhagem de ninhos e pela diminuição de locais óptimos de nidificação – muitas vezes devido ao corte de árvores. Outras ameaças referidas são: quedas do ninho e predação, quer por martas e fuinhas (Martes sp.) quer por outras aves de rapina, como o bufo-real (Bubo bubo) e a coruja-do-mato (Strix aluco).

Embora esta espécie não necessite de acções de conservação a grande escala, pode ser beneficiada com a introdução de caixas-ninho em locais onde tenham sido destruídos possíveis locais de nidificação, por exemplo, devido ao corte de árvores ou remoção de edifícios em ruínas ou montes de pedras, uma vez que aceita estas estruturas com bastante facilidade.

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Estatuto de conservação: Mundo (IUCN, 2016): LC (Pouco Preocupante); Europa (BirdLife International, 2004): SPEC 3 (Não concentrada na Europa mas com estatuto de conservação desfavorável); Portugal (Cabral et al., 2005): LC (Pouco Preocupante);

Protecção legal: Convenção de Berna: Anexo II; Convenção de Washington (CITES): Anexo IIA;

Tipo de ocorrência em Portugal Continental: Residente (Res);

Distribuição: Comum;

Dados biométricos: Comprimento: 21 a 23 cm; Envergadura: 54 a 58 cm; Peso: 105-260g; Longevidade máxima conhecida na Natureza: 15 anos e 10 meses.

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